sábado, 29 de março de 2014





É impressionante que alguém em pleno 3º milênio ainda recorra a obras faraônicas, mal-feitas,  obscuras, marcadas pela falta de transparência, pelo autoritarismo e por um sem número de mortes (como foi o da Ponte Rio-Niterói, nesse sentido justamente batizada com um nome de um grande carniceiro) para glorificar e render homenagens a um dos períodos mais brutais, sanguinários e bestiais de nossa história.


Uma série de obras são citadas para tal demonstração de afronta à memória histórica e às vítimas dessa ditadura selvagem e corrupta: hidrelétricas, aeroportos, a usina de Angra (que de tão nefasta foi alvo de uma comissão de inquérito em plena ditadura), asfaltamento de estradas e remoção de favelas (ah, claro!). 



Realmente dá muita preguiça ter que rebater a um discurso tão precário, que até uma criança recém-saída das fraldas e com grandes limitações teria vergonha de defender. Mas, fazer o quê? Se é assim, vamos lá.



É preciso refrescar um pouco a memória desses assassinos da ética e da verdade histórica.



Num belo país, num passado não muito distante, tudo ia mal, nada andava bem.  Mas com muita coragem e empenho tudo iria mudar.



Foram tomadas inúmeras medidas de expansão do crédito, de incentivos fiscais e políticas específicas.



Nunca o povo consumiu tanto, a indústria de bem de consumo pintava os canecos. De tão feliz, passou até a procriar mais - houve um expressivo aumento demográfico, como "nunca antes na história" desse risonho país. Até trepar ficou mais fácil e divertido.



Foram criados, segundo Ricardo Feijó, "mecanismos de empréstimos subsidiados (sem juros) para casamento, para aquisição de móveis e utensílios domésticos a recém-casados etc. Do lado tributário, foram removidos os impostos sobre veículos como um meio de estimular a sua produção."



Uma sem número de estradas foram criadas por todo o país. Pistas que mais pareciam tapetes. Milhares de quilômetros de estradas cobrindo a nação de ponta a ponta. E as ferrovias não ficaram atrás - uma malha ferroviária que se tornou modelo para o mundo. Até hoje!



O Primeiro Plano Quadrienal teve como principal protagonista seu Banco Central, a "reintegração de 6 milhões de desempregados através de investimentos em construção civil e indústria de bens de consumo haveria de ter um impacto sensível na economia. Mesmo com os salários congelados, o aumento da massa salarial com a expansão do emprego acarretou notável crescimento na demanda privada".

O PIB chegaria a atingir picos de 60%. A economia quase dobra de tamanho em pouco mais de 10 anos - algo espantoso. Mesmo com tamanho crescimento a inflação não passava de 4%.


Não à toa tudo isso acima relatado foi chamado com o honroso título de"Milagre Econômico", o primeiro desse país. Termo que inspiraria o sucesso econômico de uma outra ditadura, igualmente bárbara e grotesca.



Mas que joça de país é esse?  Estamos falando de qual período? De que governo?



Trata-se da Alemanha comandada por Adolph Hitler, entre os anos de 1933 e 1945. Tudo acima apontado ocorreu exatamente durante o domínio nazista. Em termos econômicos, para o progresso do grande capital na Alemanha e até para significativa parcela do seu povo: a política econômica dos nazistas foi impecável. Só que....



Só que não, é impossível abstrair o fato de que esse mesmo governo para alcançar boa parte desses resultados recorreu a campos de concentração, holocaustos, máquinas de terror e tortura, perseguições as mais selvagens contra opositores, exterminado raças que entendia como "inferiores", de que tenha usado e abusado com requintes de sadismo do trabalho escravo, pilhado nações etc.



Falta até espaço para citar outras barbaridades.



Mas na Alemanha só mesmo um psicótico e criminoso neonazista para poder ter a coragem de sentir saudades de um período desses, a despeito dos supostos ganhos econômicos. Mas, aquele com um mínimo de neurônio, compostura e - fundamentalmente - caráter é incapaz de abstrair as atrocidades que esse regime perpetrou não apenas com outros povos ou "raças" e muitos alemães, mas contra a própria espécie humana.



Então, o que dizer das viúvas da Ditadura militar brasileira: são caso de psiquiatria ou polícia mesmo???





Leonardo Soares é professor de História da UFF.

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